A estrutura do Funk no Brasil: Espaço, identidade de gênero e a economia da comunicação
- SIMtetizando

- 21 de out.
- 3 min de leitura
Atualizado: 29 de out.

O funk no Brasil vai muito além de um simples estilo musical, representa uma ação cultural que espelha as mudanças das nossa sociedade, econômicas e políticas nas áreas periféricas das cidades. A trajetória do gênero musical está ligada à interação entre o território, a identidade de gênero e a expansão da economia da comunicação. Ao longo dos anos, o funk deixou de ser uma manifestação marginalizada nas comunidades do Rio de Janeiro para se tornar um fenômeno global nas plataformas de streaming, servindo como um campo rico para o jornalismo cultural.
Do black rio ao proibidão

O funk brasileiro teve seu início nas favelas cariocas, na década de 1980, como uma adaptação do hip-hop americano e do Miami Bass. Influenciado pelos bailes Black Rio dos anos 1970, que promoviam uma estética internacional nas comunidades, o estilo musical evoluiu com o trabalho de DJs como Marlboro, que, junto com outros pioneiros, começou a adaptar o som com letras em português.
No entanto, a transição para o Funk Proibidão nos anos 2000, com seu foco na realidade das favelas e na relação com o crime e a violência, transformou o funk em uma ponte entre as periferias e o mercado da música. Seu território se tornou um espaço de resistência cultural e de afirmação da identidade da juventude periférica.
Ostentação, Pop e a economia da comunicação

A partir dos anos 2000, o funk se reinventa com o surgimento do Funk Ostentação. Nascido na Baixada Santista e em São Paulo, o gênero passa a se concentrar na exaltação de bens de luxo, distanciando-se dos temas de criminalidade. O estilo ostentação reflete a busca por uma nova identidade social, sendo uma forma de mobilidade social para os jovens de baixa renda, onde se identificam com as músicas de superação.
O movimento foi fortemente impulsionado pela lógica das plataformas digitais, que se tornaram um canal importante para a divulgação e o consumo desse novo funk. O crescimento de canais como o KondiZilla, que rapidamente se tornou um dos maiores canais no YouTube, representa a ascensão desse mais novo estilo criado à economia da comunicação, permitindo que os produtores se conectem diretamente com seu público, sem a necessidade das grandes gravadoras.
O Funk Pop surge como um resumo dessa nova fase do gênero, com artistas como Anitta e Ludmilla se tornando estrelas internacionais, representando a transição de um gênero marginalizado para um fenômeno global, com videosclipes bem produzidos para atrair um público massivo.
Objetificação vs. Empoderamento

Apesar do sucesso que o funk alcançou, as questões de gênero continuam sendo cruciais. A forma como as mulheres são retratadas é algo bastante controverso. Se, por um lado, a maneira como alguns artistas as transformam em meros objetos em suas letras e shows mostra que o machismo ainda existe, por outro, o surgimento de artistas como MC Carol de Niterói e Ludmilla trouxe uma nova perspectiva de poder feminino, confrontando as leis sociais e garantindo o direito das mulheres de serem protagonistas no estilo.
Entretanto, a apropriação cultural, em que os padrões de beleza e as imagens seguem os estereótipos da mídia tradicional, ainda é um problema. Esse processo distancia o funk de suas raízes nas periferias e de sua identidade negra e marginalizada.
Do proibidão ao capitalismo global

O funk segue evoluindo, oscilando entre a identidade local das comunidades da periferia e a economia mundial das plataformas digitais. Hoje, é mais do que um estilo de música: é um fenômeno cultural que questiona os limites da expressão autônoma dos subúrbios e as regras cada vez mais padronizadas do mercado global.
Em última análise, o funk é um exemplo claro de como a música surge de um povo excluido e se tornou um motor de transformações culturais e sociais no nosso país, ao mesmo tempo em que se encontra inserido no sistema do capitalismo global.
O funk brasileiro vai além de um gênero musical; ele reflete as tensões sociais, culturais e de mercado. Sua história é marcada pela busca por espaço, pela visibilidade e pela resistência das comunidades. Através da arte, vemos como a cultura pode ser moldada pelas realidades sociais e também pelas forças econômicas e comunicação.




Comentários