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Por que o Funk, o Rap e o Trap são tão desvalorizados no Brasil?

  • Foto do escritor: SIMtetizando
    SIMtetizando
  • 7 de out.
  • 4 min de leitura

Atualizado: 13 de out.

No Brasil, o Funk, o Rap e o Trap são estilos musicais que estão cada vez mais em ascensão. Segundo uma pesquisa realizada pela plataforma Spotify, esses gêneros musicais se destacam entre a faixa etária de 12 a 25 anos, conforme um levantamento de 2021 do portal de notícias “Metrópoles”. 


Essa crescente ascensão trouxe à tona novamente uma das discussões mais antigas: por que o Funk, o Rap e o Trap ainda são considerados estilos musicais marginalizados?


Gilbs/Rock in Rio/Divulgação
Gilbs/Rock in Rio/Divulgação

Onde surgiram o Funk, o Rap e o Trap no Brasil?

Para entender um pouco mais desse preconceito que esses estilos musicais sofrem, primeiro precisamos dar uma pequena volta ao passado e compreender onde esses estilos surgiram no Brasil e por quem foram popularizados.


Funk

Baile funk dos anos 80
Reprodução

O Funk, dentre esses estilos musicais, foi o primeiro a chegar e a obter certa relevância no Brasil. Segundo pesquisas, esse estilo musical chegou em meados da década de 1980 no Rio de Janeiro. Teve uma forte influência do Miami Bass e do Freestyle norte-americanos, ritmos que estavam fazendo muito sucesso por expressarem vocais emotivos e melódicos com mixagens envolventes.


O gênero se popularizou nas favelas e periferias cariocas, onde surgiram os famosos “Bailes Funks” que conhecemos até hoje. O principal DJ que ajudou esse estilo de música a se disseminar foi o DJ Marlboro, que fez sucesso com seu primeiro disco de funk cantado em português no Brasil, “DJ Marlboro apresenta Funk Brasil”. Após esse disco, o funk ganhou apelo entre os moradores das periferias por tratar do cotidiano das favelas.


Rap

Racionais MC's pioneiros no Rap brasileiro
FOTO: KLAUS MITTELDORF

O Rap chegou um pouco depois do Funk. Há relatos de que o primeiro contato do brasileiro com esse gênero musical foi em 1986, em São Paulo. O estilo também tem influência norte-americana, pois chegou como parte da cultura Hip-Hop, que havia acabado de desembarcar no Brasil.


Os primeiros encontros do movimento Hip-Hop, que inclui o Rap, ocorreram graças aos jovens das periferias que transformaram a Galeria 24 de Maio e a estação São Bento do metrô em pontos de encontro para b-boys, grafiteiros e MCs, para que pudessem expressar sua forma de protesto e denúncia das desigualdades sociais vividas nas periferias.


Com esses encontros, começou a surgir um grupo que é mundialmente conhecido, chamado Racionais MC’s. Definitivamente, eles foram os principais a popularizar o Hip-Hop e o Rap no Brasil. Com suas letras densas, demonstrando toda a essência e realidade das comunidades, os jovens periféricos começaram a se identificar e a sentir que finalmente possuíam voz para contestar as injustiças que sofriam, transformando assim os Racionais em um símbolo de resistência e revolução.


Trap

Raffa Moreira, considerado "pai" do Trap brasileiro
Reprodução

Por fim, o Trap é o "irmão mais novo", um subgênero do Rap. O Trap começou a invadir a cena do Rap nacional em meados dos anos 2010. Como todos os gêneros anteriores, suas raízes são originárias de Atlanta, nos Estados Unidos.


Por ser um gênero muito recente, ele começou a se popularizar no cenário underground e era visto com um certo preconceito no movimento Hip-Hop. No entanto, esse subgênero começou a se destacar na cidade de Guarulhos (Região Metropolitana de São Paulo).


O gênero ganhou força e se consolidou entre 2015 e 2019, com o principal nome sendo Raffa Moreira, após lançar seu EP “Rockstar Mixtape”. Após o sucesso e sua consolidação, nomes como o grupo Recayd Mob e, posteriormente, artistas do nordeste como Jovem Dex e Matuê impulsionaram e consolidaram o trap no mainstream brasileiro.


Diante disso, por que são tão desvalorizados?


Após entender de onde esses gêneros vieram, algumas conclusões podem ser tomadas, porém o problema é mais profundo...


A desvalorização desses gêneros é tão evidente que políticos já debateram sobre projetos de lei que visam restringir ou, indiretamente, criminalizar suas manifestações. Um exemplo notório é o Projeto de Lei n.º 200/2020, que, embora não proibisse o funk diretamente, buscava tipificar criminalmente a organização de festas ao ar livre, como bailes funk, sem autorização, prevendo pena de reclusão.


Embora a justificativa oficial frequentemente envolva a perturbação do sossego ou questões de segurança pública, muitos defensores desses bailes apontam que o Estado estará privando e dificultando o acesso do jovem periférico à sua cultura, tirando seus direitos de lazer e, principalmente, a produção cultural preta e periférica. Assim, em vez de investir em políticas públicas e culturais nesses territórios, o Estado opta pela repressão.


Além disso, surgiu o Projeto Anti-Oruam (Lei Anti-Oruam) que foi proposto na Câmara Municipal de São Paulo e que tem como objetivo impedir que a prefeitura contrate artistas que promovam apologia ao crime e ao uso de drogas. O projeto foi aprovado na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania) e avançou na Câmara Municipal.  


Certamente, a raiz desse preconceito é o famoso racismo estrutural e o preconceito de classe que historicamente marginalizam as expressões artísticas que não nascem na elite. O Funk, o Rap e o Trap são vistos como as "línguas do corpo negro" e da juventude da periferia, e a associação imediata com a criminalidade ou a vulgaridade funciona como um mecanismo para "limpar" esses estilos da cultura brasileira.


Para uma parcela da sociedade, a voz da periferia, quando ganha volume e poder de mercado, torna-se uma ameaça que precisa ser contida e controlada, ignorando o imenso potencial de geração de renda e a função social desses ritmos.


Outro fator bastante crítico é a seletividade do povo. Enquanto as letras de Rap e Trap, por exemplo, muitas vezes trazem denúncias sobre desigualdade social e violência policial, o Funk narra a realidade social periférica, abordando temas de consumo, sexualidade e poder. Entretanto, quando esses artistas periféricos narram suas vivências, são rotulados como apologistas do crime, como Oruam, MC Poze e Meno Tody.


Seguindo essa ideia, quando o mesmo caso é explorado por produções cinematográficas, é frequentemente aclamado como arte. Essa “hipocrisia social” reforça que o problema não é o conteúdo, mas sim quem o produz e quem o consome.


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